Quarto relatório do projeto Enfrenta está disponível. Webinário reuniu Ana Caetano Faria (Ministério da Saúde), Marco Antonio Zago (Fapesp) e Pedro Arantes (Unifesp)
O quarto relatório do projeto Enfrenta, sobre "Impacto da desinformação e do ceticismo na ciência no campo da saúde", acaba de ser publicado e pode ser lido em https://zenodo.org/records/10160931.
O relatório é um resumo do webinário realizado em 19 de setembro de 2023, que teve como palestrantes Ana Caetano Faria (diretora do Departamento de Ciência, Tecnologia e Inovação do Ministério da Saúde), Marco Antonio Zago (presidente da Fapesp) e Pedro Arantes (pesquisador coordenador do projeto SoU_Ciência da Unifesp). A coordenação do evento foi da jornalista Luisa Massarani e de Manoel Barral-Neto, presidente da Academia de Ciências da Bahia (ACB). O Enfrenta é uma iniciativa da ACB e da Fundação Conrado Wessel (FCW).
"Nenhum outro campo da vida pôde ver de forma tão concreta os impactos da desinformação quanto o campo da saúde, ao ponto de se tornar conhecido o termo infodemia, que se trata da circulação vultuosa de informações com intenções maliciosas em questionar os saberes cientificamente embasados e que promovem comportamentos de risco", destaca a publicação.
Ana Caetano Faria falou sobre como a desinformação contribui diretamente para mudanças de hábitos na população, dando exemplos como o aleitamento artificial, o tabagismo e os discursos antivacinas. “A ciência é uma forma de exploração do mundo de forma sistemática e sua refutação só pode existir com o mesmo rigor que aquela teoria foi criada. Não como opinião, a opinião pertence à política, à ideologia", disse.
"Para desestimular o hábito do aleitamento materno, a indústria trouxe elementos em sua propaganda que falam da força dos leites artificiais, associou tais produtos com o melhor desenvolvimento das crianças e colocou profissionais de saúde em seus rótulos. Construía-se aí a ideia de que 'só' amamentar era insuficiente. A praticidade era vendida como uma das vantagens da nutrição artificial. Isso vai repercutir no Brasil dos anos 1970, as mães chegaram ao patamar de só amamentarem por dois meses e meio seus bebês", descreve o relatório sobre a fala de Ana Caetano.
"Um outro exemplo que marcou a história das políticas públicas de saúde no Brasil é o do antitabagismo. No fim dos anos 1980, especificamente em 1989, 45% dos homens brasileiros fumavam cigarro. Entre as mulheres, essa parcela era 25%. O cigarro entre os dedos e a borrifada aparecem nos filmes, nas novelas, nas ruas o cigarro estava livremente em diversos ambientes. O charme, o glamour, a elegância e o sucesso eram associados ao tabagismo. E, nesse sentido, o estetoscópio de um médico aparece ao lado de um cigarro, relacionando o trabalho de muita responsabilidade ao tabagismo", diz o relatório.
Diariamente, pessoas consultam horóscopos e buscam explicações esotéricas para tentar entender o mundo. A desconfiança na ciência não é recente, tendo por exemplo dominado a convicção de muitos na Idade Média. "Mesmo em sociedades mais esclarecidas, ou amplamente educadas, sempre houve desconfiança sobre a ciência”, disse Marco Antonio Zago.
O presidente da Fapesp destacou a própria desinformação que surge na prática da ciência sem rigor, inconsistente, como artigos científicos que traziam nos anos 1990 associações entre vacinação e doenças. “Apesar de amplamente refutado, essa má informação circula até hoje e tem contribuído para manter milhares de crianças privadas do acesso à vacina”, disse Zago.
Pedro Arantes reuniu dados de pesquisas sobre o comportamento político e o impacto nas questões de saúde e de ciência no geral que o Sou_Ciência realizou. Sobre a vacinação, quando visto em linhas gerais; 5,5% não tomou e nem pretende tomar, 28,9% não tomou, mas pretende tomar a segunda dose; porém 93% já tomou ao menos uma das doses - para população geral do país, em todas as faixas etárias. Para Arantes, os discursos de autoridades políticas estavam impulsionando crenças de que a vacinação compõe parte da doutrinação de esquerda.
O Sou_Ciência também buscou saber como as pessoas avaliavam a gestão da pandemia. "Apenas 15% dos apoiadores do então presidente da República acreditava que a universidade faz pesquisa científica de qualidade. Apesar de 90% das pesquisas brasileiras serem feita nas universidades, uma parcela muito pequena perceba da população atentou para o fato de que as universidades são o principal espaço de pesquisa no país. Nesse sentido, 36,1% dos brasileiros não sabem o que essas instituições produzem", disse Arantes.
Os relatórios dos webinários anteriores do projeto Enfrenta pode ser lidos no site da ACB, em https://cienciasbahia.org.br/.
Os vídeos dos eventos estão disponíveis em: https://cienciasbahia.org.br/novo/videos/.
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